Como se fosse Monet

Hoje ia voltando para casa. Meio cabisbaixa, por uma dissertação inacabada. Resmugando a falta de faixa de pedestres e as calçadas irregulares e esburacadas. Reparei na loja de tatuagem e piercings, nos grafites ao lado. Um me chamou atenção, fiquei observando um pouco mais, na penumbra não conseguia distinguir muito bem uma parte em azul. Ah! É um grafite metanlínguistico, um grafite de um garoto grafitando. O azul é o boné. E essa camisa? Um pouco diferente dos desenhos que costumo ver "pixados". Gêmeos?! Mas será possível que tem um grafite deles aqui em Recife? Assim bem no meu caminho? Bem que tem mesmo o "estilo deles".

Segundo o Google, não é cópia ou imitação. Sabe lá deus se isso importa. Mas a emoção é que nem... a de ver um Monet ao vivo.

De mito à sombra

Quando conhecemos melhor nossos mitos, eles perdem o aspecto heróico e tornam-se mais humanos. Assim foi com meus pais, personagens históricos, escritores, arquitetos e professores. Não que tenha perdido a admiração por eles. Ao contrário, por vezes me fez muito bem saber que eles também erram, sentem-se inseguros, vivem uma vida "normal".

Mas adicionar no facebook... ah, isso as vezes é muito decepcionante! Talvez porque me coloque em contato com as minhas sombras, aquelas que por vezes tento renegar: egoísmo, intolerância, preconceito, racismo, narcisismo, vaidade e tantas mais.

Ainda bem que o Drummond não tem facebook. Ainda bem!

Check List


Carteira - Ok
Dinheiro - Ok
Livro (como última prioridade, obviamente) - Ok

Agora eu posso sair de casa, almoçar sem precisar olhar para o caixa do restaurante e dizer: 

Erm, então, tenho um problema... esqueci a carteira em casa e não tenho como pagar. Bom... aqui na minha bolsa, vejamos o q eu tenho... documento? Não... Não. Tá na carteira também. Na carteira que tá em casa? É. Isso. Na carteira que tá em casa. Huhum. Só tem mesmo um livro do Saramago, será que vocês tão precisando de um? Olha, é um excelente escritor! Acho que vale a refeição e mais um pacote sequilhos... para meu lanche, tomar com café, sabe?

Certo, certo. Vou em casa pegar o dinheiro. Sem problemas, é logo ali. Ué, eu volto sim, por que não voltaria?

Ah! Tem aqui uma cópia autenticada do meu RG. Não, não ando com o original. Perdi a bolsa outra dia. Não sei se você sabe, é uma dor de cabeça danada ficar sem documento. Sem carteira também? Ah sim, é verdade, é meio  constrangedor... 


O mundo que vejo da janela


Ela: Caaaadê você?!

Ele: Oi amooor, to aqui!
Aiii ai-ai aiiii! (cantando algum hit popular)
Uma vagabunda ontem, me falou que queria morrer, se jogar embaixo de um ônibus. Me diz se eu vou fazer isso? Morrer por uma vagabunda? Eu quero é ficar vivo.

Ela catava o lixo da rua - plástico e papel - e colocava numa sacola.

Eu não gosto de café expresso

O café expresso é daquele que já saiu atrasado, correndo para o trabalho e que nada pode esperar. Um jato estridente atinge a xícara. Bebe-se num gole só, no máximo dois, antes de esfriar. Sabor brusco. De uma vez a cafeína invade sua circulação e o torna apto para iniciar a rotina.

Já o café coado...

Lá da cozinha vem um cheiro bom a te provocar. Cambaleante vais andando e quando mais perto ouve: a água fumegante derramando-se no pó, deslizando para xícara. Suavamente, seus sentidos despertam. Lentamente, sente o sabor. Um gole, uma folheada na revista. Pouco à pouco chega em ti o bom humor e a coragem para começar um novo dia.

Vale a pena a anarquia?

Outro dia, como não raro acontece, me faltou comida na geladeira e o jeito foi apelar para o serviço delivery de comida chinesa. Ansiosa, fiquei na janela observando o parco movimento, esperando o motoqueiro chegar. Alguns carros passam buzinando, avisando que estão passando. Outros, andam na contra-mão. Já ouvi falarem: de noite, aqui no Centro, não tem essa coisa de mão e contra-mão, não passa quase ninguém por aqui.

Cansei de esperar na janela. Fui ler um livro, navegar na internet. E nada. Quando estava prestes a telefonar para saber do meu pedido, o telefone tocou: o motoqueiro sofreu um acidente, um carro cruzou a preferencial sem parar e colidiu com a moto.

Menos é mais

Enquanto outras cidades se orgulham de terem as maiores coisas, como em Itu onde tudo é gigante ou Recife com o seu maior shopping de não sei onde e a maior avenida em linha em reta da América Latina (né isso?), Teresina se propõe a um orgulho invertido: Avenida Antonino Freire, a menor avenida do mundo.

Porém é justo na menor avenida do mundo onde está o melhor pão de queijo de... Teresina. Não que ele não tenha sabor digno de ser considerado o melhor de todos, nem lhe falta fetiche. É vendido na  Mary Lucy, uma lanchonete que não abre assim todos os dias ou a qualquer hora. Na verdade, isso é coisa bem rara. Abre num horário restrito e, até onde pude observar, aleatório. Produz uma fornada limitada. Acabou? Já era! Quem pegou o seu seja feliz, os outros esperem para a próxima. Eu estou aqui a quase dois anos, passo pela porta  da loja dia sim, dia não e só tive o privilégio de provar esse quitute uma única vez. Nisso uma coisa me surpreendeu: não se vende aqui nem o pão de queijo mineiro, nem aquele que conheci em Maceió. 

Só não pode ser o melhor do mundo todo, porque a receita daqui não se encontra por aí.

P.S.: Eu realmente não sei de qual gosto mais, se é o pão de queijo alagoano, mineiro ou teresinense.

Barulho, ruído e música

Quase todas as lojas aqui do Centro colocam na porta uma caixa de som que vociferam muitas propagandas e algumas músicas. Acostumei-me a não gostar dessas músicas, acho as letras ruins e a melodia pouco elaborada. Não me identifico. Sobre o meu julgamento da música creio que tem fortes chances de ser uma falácia: muito rock que eu escuto tem letras imprestáveis, outros eu sequer me preocupo de traduzir e mais um  tanto não são nada elaborados melodicamente. Escuto sons artificiais e agressivos. A minha desculpa é de que o rock estravaza, é uma válvula de escape para a agressividade contida, como na música que diz "Ia na festa de rock se libertar". E por um bom tempo disse que axé, pagode, forró-eletrônico eram todas músicas de gente "sem cultura". Hoje acho que é um contra-senso elitista achar que um conjunto de pessoas é desprovido de cultura simplesmente porque não me interessei em entende-los ou porque não me identifico.

Talvez eu já tenha dito outras vezes: cada qual tem o direito de escutar o que gosta e o que quer. Vamos nos respeitar! Porém, mesmo quando assim falava, achava que os diferentes eram pessoas de profundo mal gosto. Recentemente me dei conta de um verso de Caetano "É que Narciso acha feio o que não é espelho". E se hoje continuo a me incomodar e continuo a achar ruim, repito um mantra: "É ruim para ti, que vivenciou outra vida diferente dessas pessoas. Seus gostos foram construídos por outros caminhos. Vai saber quais foram os deles!"

Miedo

Dá um enorme medo de me mostrar ao mundo e não ser compreendida. Porém se permaneço em silêncio é certo que não me entenderão.

Aula prática sobre "Memória e Sociedade"

- Eu tenho umas coisas gravadas aqui.
- Gravadas como? Em fita?
- Não! Na memória.

Espanto.

- Se quiser eu escrevo pra você...
- Mas o senhor nunca escreveu? Como é que o senhor criou?
- Na mente, na memória!

(Conversa minha com seu Raimundo Branquinho, em Buquinha povoado agrícola de Teresina)

Ô coisa boa!

Abraço está entre as coisas mais gostosas. Sentir uma vida tão próxima, uma vida querida.

Alvura intimidante

A folha de papel é tão quieta que me intimida. Só eu e ela. Não preciso adaptar meu discurso diante de suas falas. Mas incrivelmente não me sinto tão à vontade.

Minas Gerais, o norte magnético e o norte geográfico

Os arquitetos precisam saber bem direitinho onde está o norte, para saber de onde vêm os ventos e a insolação. No entanto, não há apenas um norte... o que usamos nos nossos estudos e o que está marcado nos mapas é o "norte verdadeiro" enquanto a bússola nos aponta para o norte magnético. Caso nos seja dado o norte magnético é bem simples saber o norte verdadeiro*, basta "descontar" a declinação magnética. Como vocês podem verificar, a declinação varia de acordo com o lugar do planeta e não é muito difícil de achar esse valor pesquisando na internet.

O que eu sempre me confundia era pra qual lado estava cada norte. Até um professor me ensinar um macete**: MG é a sigla de Minas Gerais ou nos lembra que o norte magnético está a esquerda do geográfico. Anotei essa dica no meu diário de bordo para não esquecer nunca mais e agora a transferi aqui para o mundo virtual. 

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* Se alguém tiver curiosidade, no How Stuffs Works tá tudo bem explicado. É só chegar aqui.
** Válido para o Brasil inteiro, mas não para o mundo todo.

Pensamentos fervilhantes

Verdade que os meus pensamentos fervilham quando estou deitada. Filmes de ação, drama e comédia. Certos dias penso que isto se dá por eu ter a mente sempre cheia. Daí imagino ser necessário esvaziá-la para ter um sono sossegado. Queria parar de pensar... os meus pensamentos me atrapalham até de ler um livro. Talvez a culpa seja do escritor, incapaz de segurar-me com seu enredo. É isso, a culpa é toda do escritor!

Contra-uso do objeto

Monitor com tubo de imagem serve como assento para mototaxista na Praça Rio Branco em Teresina.

Shopping Popular, mais um território da Coca-Cola.

Foram poucas às vezes que entrei no Shopping Popular. Há uma infinidade de produtos oferecidos ali, todos expostos amontuadamente. No último piso, uma praça de alimentação. Não é preciso chegar muito perto para sentir o cheiro forte de comida. Da primeira vez que fui lanchar lá uma mulher - vendedora de lingerie - se apropriou de um discurso comumente masculino: até que enfim uma pessoa bonita passando

Rock in Rio

Estou me desfazendo aos poucos dos objetos materiais que representam minhas lembranças. Quero ficar mais leve, caminhar para frente e guardar menos coisas dentro de casa. Daqui a alguns poucos meses terei de me mudar novamente, quanta coisa vou poder carregar comigo? Sempre fico pensando que o processo de desapego nada tem a ver com a ideia de preservação do patrimônio cultural material. Pois bem, releguei

Garis

A princípio eu me incomodava com o estrondoso barulho do caminhão de lixo que passa entre dez e onze da noite. Por vezes estava dormindo e me acordava assustada. Agora não durmo mais tão cedo e não raras vezes vou para a janela observar o caminhão passar e o bom humor dos garis. Assobiam, brincam e cantam: vou apertar mas não vou acender agora*.

Apesar de ter um bar na minha rua, não me acostumei a frequentá-lo como extensão da casa, como muito facilmente acontece com os bares das nossas ruas. Em outros tempos, ia mais por lá. Os amigos moravam aqui pelo Centro e os happy hours eram mais frequentes. Alguns amigos foram-se de Teresina e outros foram-se do bairro. Cá fiquei, no hotel desativado.

Mas essa semana outros amigos me chamaram nesse bar. Eu que mesmo ouvindo a música tinha sentido preguiça de ir lá fora vivenciar a cidade, resolvi sair. E talvez pela primeira vez fui à rua no mesmo momento que passava o caminhão de lixo. Realmente não me espantei que ficassem me olhando e falando gracejos entre si. Só fiquei pensando se sabem eles que os olho quase todos os dias.

*O repertório deles não se restringe a essa música. Essa foi a última que me marcou.

Fumaça

Moro perto do aeroporto. Acostumei-me a ouvir os aviões pousando e decolando. Porém hoje, um avião parecia brincar, a zoada não cessava, nem representava uma trajetória retilínea. Resolvi então verificar o que se passava. Um avião da Esquadrilha da Fumaça, havia vindo me dar bom dia. Quase que toco suas asas. Coloquei meus óculos escuros e fiquei a ver o espetáculo da minha janela. 

Lá longe, pareciam até passarinhos.


Fragmento

Isso:

"O tempo fragmentário não é linear, poderia ser circular, ou melhor, em espiral, com diferentes níveis desenvolvendo-se mutuamente". ( Paola Berenstein Jacques em "Estética da ginga")


Lembrou-me isso: O tempo

Disforme

E ficou horrível a minha letra.

Lidar com o que é troncho às vezes é doloroso, de tão acostumados estamos a determinados padrões. Porém, isso me parece contraditório. Como humanos, somos sempre imperfeitos.

Profissão

Confesso que estou satisfeita com a minha profissão de arquiteta. Se eu fosse depender de ser literata, morreria de fome.

Segredo

Hoje perdi o segredo do meu cadeado. Haja dedos para girá-lo:
10^4 = 10 000. Dez mil possibilidades?! Perdi foi o cadeado.

O lacre laranja bem que anda funcionando a contento.

Sonhar

Depois de tanto sonhar, estou morando sozinha. Um quarto só para mim. E a solitude também. Mas posso ouvir minhas músicas sem que ninguém reclame. Comer nos horários da minha fome e a comida que me apetece.

Aqui e além


O capitalismo na sua forma mais selvagem ainda não chegou aqui. A globalização uniformizadora ainda não fez tantos males nessa terra.

No teatro, não há como pagar com crédito, tão pouco é sempre necessário pagar mesmo quando a entrada não é franca. O funcionário do supermercado se sente a vontade em roubar frutinhas importadas para cortejar a cliente. Aos domingos, guarde seus instintos consumistas, quase não há lojas abertas mesmo no templo do consumo só funciona o cinema (sem promoção maldosa de pipoca). Se você tem olhos claros,

Cidade Ortogonal

Descer do prédio. Girar o corpo em sentido anti-horário (na direção da loja de chocolates) . Andar reto e contar 6 quadras. Dobrar a esquerda. Esse é o meu trajeto. Mas como sou esquecida, é melhor anotar o endereço num pedaço de papel: direção norte, 6 quadras, esquerda.

Transporte público urbano

Gospel, uma mulher no banco quase em minha frente .

Funk, três adolescentes no fundo do vagão. Uma com uma espécie de roupa street dance, outra de vesitdo de manga-comprida e curtíssimo, a terceira, de rosa, não lembro direito.

Olha o termômetro com display LCD! 60 segundos, não precisa contar no relógio, nem no dedo, que ele vai apitar. Na farmácia é uns 15, 20 reais. Na minha mão não é 10 ou 9, na minha mão é 5.

A cena não poderia ser mais esdrúxula. Descobri que havia feito um julgamento precipitado quando o vendedor lançou outro argumento publicitário:

Minha gente eu bebi demais no show do Zeca Pagodinho, fiquei sem grana. Me ajuda! Olha o termômetro! Olha o termômetro com dislpay LCD 60 segundos num precisa contar no relógio nem no dedo ele vai apitar na farmácia é uns 15 ou 20 na minha mão não é 10 ou 9. Na minha mão é 5!

Situação caricata? Não, ainda. A do banco quase na minha frente resolveu tentar converter o ambulante. Ele porém só pretende "entregar a vida a Jesus" quando tiver doente. A da música gospel alertou:

Olha que a gente morre até em pé.

O taxista e o patrimônio cultural

Alugo no carnaval, esse ano já tá alugado, 14 mil reais de sexta à quarta. Parecem pequena mas são grandes, de quarteirão, tem de 4 a 5 quartos. A parede é da largura desse carro. Patrimônio histórico. Só é caro pra manter, é salgado mesmo. Sorte que eu tenho um cunhado mestre-de-obra. Morando nessa cidade a gente também acaba absorvendo a tradição, pega o estilo de viver da cultura. No fim da tarde eu vou jogar capoeira, de noite vou para academia. Eu já fiz apresentação também... Vivia dentro do navio fazendo apresentação de capoeira. Enjoa que é danado! Sorte que o resto do grupo não passava mal. Eu não queria nem me apresentar... às vezes ficava internado. Mas eu parei, tinha que viajar demais. Também eu tenho uma filha de 11 anos. Eu quero batizar ela na capoeira.

Não existe amor em SP?

A princípio gostei da música. Sonoridade e letra. Mas quando fui dormir com o refrão ressoando em minha mente, angustiei-me. Que fazemos se falta por completo amor na cidade mais populosa de nosso país? Não sei vale a pena discutir o que fala um poeta. Ele fala o que finge sentir, e o que ele sente é a dor alheia (diria Fernando Pessoa). Expressa uma realidade, mas como sempre nos acontecesse é uma expressão parcial, imperfeita, inacaba.

Falta-nos amor, concordo. Porém também estou de acordo sobre a força das energias que manipulamos, com pensamentos e ao proferir palavras. Talvez nós fizesse melhor repetir outro refrão, menos lamurioso. Às vezes cantar o amor em cenários de miséria e violência pode soar néscio. Chico Buarque, foi criticado por vários quando compôs "A Banda" nos tempos da ditadura. Outros que já não aguentavam tantas mensagens violentas, agradeceram ao compositor pela melodia alegre, a letra "leve".

Os noticiários nos falam da violência constantemente. Conhecemos por testemunhos alheios. Fingimos nos indignar, lamentamos as tragédias vistas na tevê. Mas o que, efetivamente, temos feito?

Cadê seu chapéu?

Já não posso andar sem o meu. Perguntam-me por ele na padaria, onde passei uns dias frequentando diariamente. São pequenas rotinas que nos fazem pertencer aos lugares. É bom quando me olham e advinham meu pedido. Quando sentem minha falta durante as minhas viagens. Quando não colocam açúcar no meu suco, nem manteiga no meu sanduíche. Sentirei saudades.

Rodoviária

Era véspera de natal. Um moleque pedia dinheiro pra ir para casa, enquanto eu arguia ele (se fosse o caso poderia eu mesma comprar a passagem e entregar-lhe o bilhete) uma senhora lhe deu uma quantia. "Agora só falta dois". O moto-táxi do outro lado da pista o levaria. Completei a passagem. Feliz da vida o menino nos agradeceu, apertou a mão da senhora e a minha. Não tem de quê! "Você além de bonita, é educada". Nessa situação, não estava esperando um elogio, ainda mais sobre a minha educação. Mas como me disseram no post anterior, elogios são bons, eu estava feliz.

É um espaço escuro. São assim as rodoviárias que conheço, muito concreto, pouca iluminação. Comércio de artigos mais baratos, lanchonetes não tão atraentes.

"O vidro é leve para o seu braço, mas pesado para o seu bolso". Assim dizia um bilhete na banca-de-jornal-bebidas-e-biscoitos onde comprei uma cajuína.



Autocrítica

Eu me incomodo por ainda apelar para voz de criança. Fiquei feliz por terem me notado mais mulher, mas sinto que ainda preciso fazer muito esforço. A ideia de escrever todo dia uma reflexão foi para o beleléu. E a ideia de uma simples descrição do dia, parece-me infantil. Talvez realmente falte-me o hábito da reflexão. Já me falei algumas vezes que eu deveria parar de falar tanto e ouvir mais as pessoas. Bebada, eu falo muitas bobagens, a mente fica confusa e os pensamentos que eu tento ocultar escapam bem confusamente. Sou repetitiva. Penso que torno-me chata. Reconheço características em mim nada admiráveis. Sinto a necessidade de receber elogios. Embora esteja me acostumando a uma certa indiferença.

Deixem de meandros!

Já fiz isso e já vi outros escrivinhadores fazerem: desculparem-se pela falta de profissionalismo ao escreverem literariamente. Não há nada errado ou certo no modo de uma pessoa se expressar. Mas as formas de escrever, para além das palavras, denunciam características dos autores. Talvez quem se desculpa sofra da recorrente "baixa auto-estima" ou pense estar adentrando seara que não lhe pertence. Louvo-lhes pela iniciativa de ainda assim colocarem-se ao exercício, mas sugiro: abandonem os meandros! Não há nada a temer.

Steve Jobs

Já me assegurei, acontece com um monte de gente, ficar assim com a cabeça em outro lugar, imaginando fatos e diálogos. Aliás, é a esse ato que os escritores e letristas chamam trabalho. Diferem de nós outros, apenas pelo dom (ou o hábito) da escrita.

Pois estava ali na "cozinha"* lavando os pratos e viajando no meu mundo. Eis quando chega o momento do Steve entrar em cena. Puta merda! Ele morreu! Agora não pode mais atuar nos meus filmes mentais... perdi um personagem tão importante.

Só agora, dei-me conta. Aí... como sou devagar.

*A minha cozinha é o meu banheiro. Dá pra entender? Mas é assim mesmo.

Eu vou pro mundo da lua


Que é feito um motel
Aonde os deuses e deusas
Se abraçam e beijam no céu..."


Tava disposta a essa viagem, quando me perguntei: bicho, cadê o Gabriel Pensador?! Já que Raul morreu e nos deixou órfãos, acho que o Gabriel fez nos anos 90 um papel bem importante. Mesclou os ritmos brasileiros com letras afiadas, críticas bem colocadas. Fui dar uma pesquisada para saber do moço, descobri que ele escreveu um livro: Diário Noturno e que tem um blog pessoal. O blog tem um estilo que

Feijão Preto

Quando morava com a minha família, pensava: no dia que eu morar só vou precisar de um termômetro eletrônico. Nunca soube baixar a temperatura daquele de vidro, se tivesse um piripaque qualquer só um eletrônico me salvaria. Tenho o meu termômetro, como previ, e esse já me foi muito útil.

Agora só penso no feijão preto, pro caso de ir morar fora do país. Adoro experimentar comidas. Exóticas, tradicionais e étnicas. Sushi, caldeirada ou panelada. Mas não tem jeito, a longos tempos o meu preferido é, com alho, o feijão preto. Basta o cheiro subir, já estou sorrindo e pensando: sem esse daí eu me dano, perco meu juízo.

Rio de Janeiro, 03 de outubro de 2011


Fui no aeroporto Santos Dumont trocar minhas passagens de avião para visitar meu namorado. Santos Dumont, construção moderna não sei de qual arquiteto, mas os jardins certamente são de Burle Marx.

Descobri que não há quase dinheiro na minha conta. Raspei os 20 reais restantes (provavelmente do crédito que o Banco me dá). Apenas um pouco além do que necessito para retornar para casa.

Torci para a alteração da passagem não custar além da nota de 100 que havia reservado na carteira. 99 e 30 centavos. Sem crédito no celular. Resolvi procurar o CCBB onde há entretenimento e cultura gratuitos e um banco para verificar se a minha ajuda de custo já caiu.

Ao som de Raul cantando o Rio, saí me sentindo leve sem o peso do níquel ou da comunicação intermitente.

Um prédio suntuoso. Mosteiro? Santa Casa da Misericórdia. Travesti com cabelos de linha e fumante sorri para  mim, enquanto eu passava por uma feira desconjuntada.

Depois caio na Avenida Antônio Carlos. Outro prédio suntuoso. Pesado. Lembra-me Bruand. Trânsito absurdo de ônibus. Ministério da Fazenda. Sim é ele, já do século XX, com aparência greco-romana. Contemporâneo do meu amado Gustavo Capanema.

Clima agradável, nem frio, nem calor. Nem sol, nem chuva.

Escrevo ao pé dos postes que iluminam a escadaria.

Há cidade no meu quarto

Em meu quarto
fala a cidade
Acorda-me
Salva-me
da solitude

Mas se há saudade
Não me acuda
Não me basta
nenhuma cidade.

Tomada de posição

Sobre a Belo Monte, os estudantes da Usp e outras polêmicas do porvir:

"Meu partido está tomado. Não da Arena nem do MDB, sou desse partido congregacional e superior às classificações de emergência, que encontra na banda o remédio, a angra, o roteiro, a solução. Ele não obedece a cálculos da conveniência momentânea, não admite cassações nem acomodações para evitá-las e principalmente não é um partido, mas o desejo, a vontade de compreender pelo amor, e de amar pela compreensão.
(...)
Coisas de amor são finezas que se oferecem a qualquer um que saiba cultivá-las, distribuí-las, começando por querer que elas floresçam. E não se limitam ao jardinzinho particular de afetos que cobre a área de nossa vida particular: abrangem terreno infinito, nas relações humanas, no país como entidade social carente de amor, no universo-mundo..." (Segundo Wagner Homem no livro "Chico Buarque", essas são palavras de Carlos Drummond em homenagem a música "A Banda".)

6 ou 7

Somos 6 ou 7 bilhões de pessoas perdidas e amontoadas ou achadas e dispersas Terra a fora? 

No meio do ano visitei no Masp, a chamada exposição 6 bilhões de outros. Infelizmente divulgo tarde a mostra, que deve estar viajando mundo. Mas fica aqui um registro do projeto de  Yann Arthus-Bertrand, fotógrafo francês, em parceria com Sibylle d'Orgeval e Baptiste Rouget-Luchaire. 

"5.600 entrevistas foram gravadas em vídeo em 78 países..." Pessoas de diversas etnias, classes sociais, nacionalidades responderam a um mesmo questionário. Como resultado, nos deparamos com uma deliciosa diversidade. Diversidade estética e ética, de histórias e memórias, além mais.

No site do projeto descobrimo-nos mais de 7 bilhões e podemos assistir aos vídeos que compõe a exposição.

Em consequência ou não desse trabalho, seu idealizador fundou a GoodPlanet, cuja missão é educar e sensibilizar o público para a preservação do meio ambiente. 

Bonitas iniciativas.

Vulnerabilidade

Perigoso escrever essas coisas, mais perigoso ainda seria entrar em detalhes. Talvez esse pudesse ser um exercício interessante. Às vezes considero colocar mesmo os meus textos mais íntimos no blog. A ideia é contribuir para expor quão humanos somos todos. Portanto, o quão inocentes, imbecis, iludidos, alegres, voluptuosos, amorosos, somos todos.

Mas ainda não tenho coragem.

Retorno

Tentei abrir a porta de casa com a chave do trabalho. Sempre tenho essa nóia: vou chegar e a porra da fechadura vai tá trancada, vou ter que gastar uma grana com um hotel. Mas como raramente acontece, me trouxe em casa um taxista que não estava na ânsia de voltar para o aeroporto e pegar outro passageiro. Fez o trajeto sem correr, ajudou-me a tirar as malas do carro e me ajudou a ter paciência em tentar abrir a porta do prédio.

Minha planta morreu. Comida estragou na geladeira. O resto estava relativamente em ordem. Algumas roupas com aspecto juvenil separadas para a doação. 

A balança da farmácia estava quebrada. No supermercado, o leite não estava no mesmo lugar. Mas o Mano ainda trabalha aqui e os mendigos são os mesmos: o de frente a ótica, o de frente da loja de roupas, a da frente da padaria.

Riachuelo

Morei numa casa quase subterrânea com 3 pessoas, passávamos direto do elevador e descíamos 2 lances de escada, entrávamos no primeiro corredor a esquerda. Abrigo anti-guerra, cafofo, bat-caverna. Bom para o isolamento, sequer sabíamos da temperatura lá fora. Estávamos um pouco mais quietos. Praça já-sê-gay? Praça jaca-gay? Era tupi, era Jaceguai. Graças a Deus! Consegui carregar minhas malas. Bastou-me uma bota dourada, um tênis surrado e uma chinela de borracha - já estragada.

Direito nosso

Pertence a nós todos o direito da expressão por meio da arte. Seja pelo desenho, dança, música e tantas outras. Melhor ainda: não somos obrigados a um padrão estético uniforme ou a uma perfeição profissional. Permitamo-nos, portanto, a expressão sensível.

Recomendo veementemente "A Estética do Oprimido" de Augusto Boal.

Exercício

Tinha planejado ficar em casa estudando. Mas me bateu um desespero de estar em um espaço tão miúdo. Faltou-me ar e fomos à praia. Passear pela cidade, ver dois lados da lagoa, as pessoas que subiam e desciam do ônibus. Absorver o ar e o cinza da cidade.

Metamorfose

Estou magoada com a sociedade. Grave. Quero voltar a buscar uma forma de ser mais amorosa e menos agressiva.

Questionamentos, relativizações, conversas cíclicas. Ao menos se eu sintetizasse meus pensamentos em textos, talvez meus diálogos fossem mais produtivos. Sempre sinto vontade, necessidade de fazer infinitas coisas e procrastino-as várias. Compreendo que não posso deslocar de mim a responsabilidade pelas minhas omissões e erros. Mesmo que  incida nesse erro primário em várias ocasiões.

Escrever ao fim do dia sobre as minhas experiências cotidianas era uma das minhas ideias. Pensava nisso como tentativa de refletir mais pacientemente sobre as minhas atitudes, melhorar minha técnica de redação, acalmar meu ritmo.

Sinto desânimo ao constatar quão díspares as vezes são o meu discurso e as minhas atitudes. Engraçado é que por alguns momentos achei completo absurdo identificar nos outros essa disritmia (velocidade com que se formulam novas ideias e conceitos diversa da velocidade com que se pratica esse aparato ideológico). Mas comecei a desconfiar que a contradição talvez seja recorrente no homem e em suas instituições.

Então engulo seco e começo a milionésima metamorfose.

Amado Lar

Depois de algumas doses alcoólicas, tive a salvação do mundo em minhas mãos. Tão logo veio a sobriedade, ela se esvaiu. Infelizmente. E ainda, antes que eu fechasse minhas janelas, a lua se riu. Mas isso não há de ser sério. Isso... há de ser, na verdade, um bom sinal.

Produto Alimentício

1. A consistência do produto. 
Para transportar, quanto mais firme for o produto, melhor: impede que o produto se amasse, permite o empilhamento. Todavia, um produto rígido, não seria agradável para a degustação. Como resolver o impasse? Simples, basta o produto ser rígido no momento do transporte e macio no momento do consumo.

2. Tamanho da embalagem.
Uma unidade é o tamanho ideal para o lanche de uma criança pequena. Porém haverão aqueles que não se satisfarão com uma unidade e até mesmo a mãe da criança provavelmente quererá transportar várias unidades para casa. Basta então criar uma estrutura que acople várias unidades em uma. E demos um "plus" ao nosso produto, utilizando uma conexão entre a unidade e a "estrutura de acoplagem" feita de tal maneira que a própria é um "termômetro" indicador de quando o produto já terminou sua transição entre a consistência rígida de transporte para a maciez propícia ao consumo. (É bacana quando o produto fala com você e essas coisas dinâmicas ficam ótimas em campanha de publicidade, que nem a escova de dente que muda de cor quando precisa trocar!)

3. Embalados separadamente.
Particularmente, achei muito inteligente quando a indústria de absorventes começou a embalá-los separadamente. Facilita o transporte dentro da bolsa! Alguns produtos alimentícios também seguem esse princípio (iogurtes, torradas, aqueles queijos extramente artificiais de consistência pastosa), são ótimos para o lanchinho. O nosso produto, então, também terá embalagem individual. Porém dessa vez desenvolvemos uma embalagem individual realmente inteligente. Nada de ratar na hora de abrir o pacote. Eu mesma, vez ou outra erro na força/velocidade de abrir o iogurte, corto aquele alumínio fininho na metade, esbarro o dedo no líquido. Uma melequeira. 

A nossa embalagem individual será aberta suavemente até chegar a um suporte na base, onde você segura o produto. Ideal para comer no meio da rua. Mantem o produto longe da mão suja de dinheiro, e a mão longe de se sujar com a comida. E em tempos de sustentabilidade, obviamente que não esqueceríamos de desenvolver nossa embalagem com material biodegradável.

Fantástico, o design da banana!

Mestrado

Foi uma alegria enorme ver o entregador de pizza no domingo a noite.

Efeito Tyndall

Até na poeira há beleza. Flutuando no ar, em suave movimento de decadência, sua quase ausência corpórea nos ludibria e pensamos: poeira é luz. Há uma aura de magia. Mas, de fato, é só sujeira. E eu fico cá, admirando a sujeira cair sobre meus móveis.